sábado, 22 de dezembro de 2012

Através do Espelho (Jostein Gaarder)


        Mais uma vez usando sua capacidade reflexiva, fruto de uma carreira como docente em Filosofia, que lhe inspirou na elaboração de sua obra mais famosa, O Mundo de Sofia, Jostein Gaarder desta vez procura confrontar a iminência da morte, como uma forma de entender a carga de sentido da vida.
         Cecília Skotbu é uma garotinha portadora de câncer, em estágio terminal. Mesmo não reclamando continuamente de dores, sente que seu corpo se enfraquece cada vez mais, mas mesmo assim acredita firmemente que vai ficar boa. Sua queixa principal era não poder fazer diversas coisas que as outras crianças faziam e estar impedida de esquiar na neve. Confinada a maior parte do tempo dentro de seu quarto e presa a sua cama, Cecília via o mundo apenas de sua janela. No entanto, seus pais e avós dedicavam-lhe todo o carinho e atenção, mesmo sentindo o coração apertado por serem tão impotentes diante de sua doença, restando-lhes apenas se conformarem com o que inevitavelmente aconteceria a Cecília.
        Em uma época de Natal, quando as atenções de todos voltavam-se para os preparativos finais da tradicional celebração em família, Cecília recebe uma estranha visita: um anjo chamado Ariel. Em um primeiro momento, surpresa diante daquele estranho ser, Cecília logo se simpatiza com o anjo e começa a se abrir. O mesmo acontece da parte do anjo, que se revela um grande companheiro para a solitária menina. Cecília e Ariel começam a conversar sobre diversas coisas existentes no céu e na terra. Nesse diálogo, Cecília aproveita para esmiuçar suas dúvidas acerca do agir de Deus, a natureza dos anjos, o paraíso celestial, o companheirismo dos anjos da guarda, etc.. Encantada diante de algumas respostas, Cecília anota frases interessantes em seu caderninho chinês, que conservava debaixo de sua cama, meditando em seu coração aquilo que registrava. Por outro lado, Ariel revela sua curiosidade em compreender coisas como o que é ter o corpo revestido por uma pele, como é sentir o gosto e o cheiro das coisas e como são as sensações de frio, calor, bem como a sensação da dor. Dessa forma, fica clara a distinção entre as naturezas angelical e humana.
            Com o passar do tempo, a amizade entre Ariel e Cecília se estreita cada vez mais. Ajudada pelo anjo, a menina finalmente consegue voltar à montanha e esquiar, além de fazer diversas outras coisas de que se afastara desde que adoecera. Ariel se tornara visivelmente o anjo da guarda que sempre fora para Cecília, mas que demonstra sua amizade sincera, até o momento em que a menina adormece serenamente em sua cama, para nunca mais acordar.
           Através do Espelho busca enfatizar, por meio do carisma infantil, o outro lado da existência humana. A presença do anjo junto a Cecília se torna a melhor maneira de fazer com que ela não se sinta só em um momento que sua mente infantil não seria capaz de compreender a dor que sua morte traria a sua família. O diálogo entre os dois é rico em sentido existencial, uma vez que o fato de poder sentir o gosto dos alimentos, tocar a neve macia e vê-la se dissolver, sentir o calor do fogo em uma noite de inverno se tornam motivos mais do que suficientes para cuidar, preservar e reverenciar a vida como a mais bela expressão do ser. Desta forma, na linguagem cândida das crianças perceberem e falarem do mundo, Jostein Gaarder busca dissociar nos mistérios simples da vida, o sentido oculto da palavra morte. Somente uma vida vivida com intensidade torna-se capaz de aceitar com serenidade o fim de tudo o que é belo, para dar lugar a tudo o que é novo.


REFERÊNCIA LITERÁRIA
Título:       Através do Espelho
Autoria:     Jostein Gaarder
Editora:     Companhia das Letras
Ano:          1998
Local:        São Paulo
Edição:     
Gênero:     Romance

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